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Estabilidade do servidor: preservação do interesse público

Um dos pontos mais questionados da Reforma Administrativa entregue ao Congresso pelo Governo Federal no início deste mês trata da estabilidade do servidor. Mas por que é tão importante manter essa garantia àqueles que servem ao Estado?

– A estabilidade é uma medida de proteção do servidor contra o arbítrio e a corrupção. Ela o protege de pressões indevidas e dá a segurança necessária para que ele cumpra seu papel de servir à sociedade sem temer retaliações. É a estabilidade que garante que o servidor não se tornará refém de dirigentes políticos com atuação transitória e que servem a interesses de curto prazo.

– Apesar de estar sujeito aos governantes eleitos e dirigentes superiores, o servidor não é apenas um cumpridor de ordens, mas sobretudo um guardião do interesse público, independentemente da duração dos governos. E graças a estabilidade é possível manter uma continuidade administrativa, sem a qual se perderia a memória técnica das organizações públicas e do próprio Estado. A estabilidade é o que garante que ele seja um servidor do Estado e não do Governo, uma vez que o protege de perseguições políticas de diferentes interesses. Como garantir, por exemplo, a regulamentação e fiscalização do mercado mobiliário, um ambiente repleto de interesses múltiplos e que envolve grandes corporações, se não houver estabilidade para o corpo funcional da CVM?

– A estabilidade, portanto, permite que o servidor público seja um importante agente de combate à corrupção. O Estatuto do Servidor (Lei no 8112 de 1990), inclusive, prevê que este tem o dever de levar ao conhecimento de autoridade superior ou, quando houver suspeita de envolvimento desta, informar à autoridade competente, sobre irregularidades de que tiver ciência em função do cargo ocupado. E ao fazê-lo não poderá ser responsabilizado civil, penal ou administrativamente.

– Após ingressar na carreira por meio de concurso público, o servidor passa pelo chamado estágio probatório. Trata-se de um período de três anos durante o qual é avaliado para saber se está apto a desempenhar a função para a qual foi selecionado. Somente após o cumprimento do estágio probatório, o servidor alcança a estabilidade. E, por ter estabilidade, os servidores públicos não têm FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), direito de trabalhadores regidos pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). Neste caso, o empregador deposita todos os meses, neste fundo, 8% do valor pago ao trabalhador. O FGTS funciona como uma “poupança”, no caso de demissão sem justa causa: o empregado pode sacar o Fundo e garantir algum recurso até encontrar outro emprego. E justamente por terem estabilidade, os servidores não são contemplados com o FGTS, uma vez que só podem ser exonerados em circunstâncias específicas, como veremos a seguir.

– Um dos argumentos para que a estabilidade seja derrubada é a de que ela impede a demissão do “mau servidor”, aquele que não cumpre adequadamente o papel que lhe é atribuído. Isso não é verdade. Se for condenado por crimes ou atos de improbidade, com sentença judicial transitada em julgado, o servidor estável pode perder o cargo. O que também pode ocorrer caso tenha cometido infrações administrativas comprovadas por processo administrativo. Pode ser punido, inclusive, depois de encerrar as atividades com a cassação da aposentadoria. O desligamento também pode acontecer por desempenho insuficiente. Dados da Controladoria-Geral da União mostram que, entre 2003 e 2019, 7900 servidores estatutários foram punidos com a perda do cargo.

– O artigo 169 da Constituição Federal prevê inclusive a demissão do servidor estável, caso haja excesso de despesas com pessoal. Neste caso, primeiramente se deve buscar a redução em pelo menos vinte por cento das despesas em cargos de comissão e funções de confiança e a exoneração de servidores não estáveis. Portanto, não se pode acusar a estabilidade de ser o motivo de engessamento do volume de gastos com pessoal e suposto impeditivo de redução das despesas que comprometeriam o equilíbrio das contas públicas.

– A Constituição também prevê a possibilidade de extinção de cargos, o que levaria os servidores que ocupem essas funções a ficarem em disponibilidade até que sejam reaproveitados em outro posto. Desta forma, a estabilidade não impede que cargos e carreiras sofram as adequações necessárias que venham a surgir como, por exemplo, em função de avanços tecnológicos.

Nós do SindCVM questionamos a proposta da Reforma Administrativa elaborada pelo Governo Federal e acreditamos que a estabilidade é uma prerrogativa fundamental para que o servidor – tanto os que já exercem suas funções, quanto os futuros – estejam blindado dos interesses mais diversos e sejam agentes do combate à corrupção, garantindo assim um serviço de qualidade e integridade pública.